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A sociedade pós-moderna e as dificuldades de sobreviver off-line

On-line até a vida é

18/03/2019 às 20h08 Atualizada em 10/09/2020 às 16h23
Por: Cláudio Bertode
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A sociedade pós-moderna e as dificuldades de sobreviver off-line

Há algum tempo, ao chegar em casa, depois de um longo dia de trabalho e, como todo cidadão da era digital que se preze, imediatamente liguei meu computador pessoal, ativei o wifi do celular; e claro que me conectei a minhas redes sociais preferidas. Como sempre fiquei lendo algumas postagens “interessantes”; no entanto eis que de repente uma epifania me roubou de mim. Foi, instantaneamente, uma revelação tão intensa e ao mesmo tempo algo que se fez angustiante. Fiquei olhando à frente uma verdade incontestável; triste percepção de que o mundo digital sumiu com as pessoas. Cadê as pessoas? Tudo agora se resume a uma superpopulação de perfis.

Bem claro agora, outra inevitável verdade se revelou e se desvelou diante de meus olhos: o fato de eu não ser muito bom nos bate-papos virtuais; modalidade interativa que trouxe estranheza ao ato de falar. Fico longo tempo refletindo essa novidade intrigante de não mais falar com a boca, e sim, com os dedos.  Às vezes, teclando letrinhas muito pequenas na tela do celular; outras vezes digitando num teclado de computador. Sinto-me deslocado nessas conversas, dá certa agonia a demora de uma resposta do interlocutor.

Percebe-se também um fato curioso que é a óbvia constatação de que um grupo de perfis se interagindo não são como um grupo de amigos no barzinho da esquina em que todos riem em sentido literal. Não expliquei bem? Refiro-me àquelas risadas estrondosas e descontraídas. Risada espontânea de uma pessoa. Aqui no mundo dos perfis; o som gostoso e único do riso sincero de uma pessoa, que por acaso tenha achado graça de uma piada, foi substituído por risos “fakes” em formas de onomatopeias do tipo kkkkkkkkkkkkkkkkk ou shuashuahuaaaaaa ainda um leve rs rs rs. Por isso que decidi diminuir as possibilidades de interação verbal nas redes virtuais; assim, já deixo o mensageirozinho nativo do facebook desativado por padrão. Não mais instalo watsapp no meu android. No Skype eu apenas conecto em caso de uma extrema necessidade, a exemplo de um suporte on line, algum curso à distância. O que, claro, quase nunca acontece, uma vez que não sou dos grandes adeptos do EAD. Timidez? Casmurrice? Emburrado mesmo? O cara se acha? A resposta é mais simples, caro leitor... é que não tenho muita paciência para falar com uma pessoa sem olhar nos olhos. Tudo bem que tem webcam, mas muitos poderiam achar que sou algum tipo exótico de maníaco, caso eu ficar o tempo todo condicionando o início de uma conversa ao quando a outra pessoa ligar a câmara para olhar nos olhos dela.  Eu dizer, por exemplo, “_Você poderia ligar a câmara para eu ficar vendo seus olhos enquanto conversamos?”. Não, muitos certamente, não iriam entender.

Tudo bem que às vezes pergunto ou respondo um ou outro questionamento feito em mensagem direta, respondo igualmente um ou outro e-mail. Deleto a maioria, vai que é vírus; aliás, já aviso aos hackers que estiverem lendo esta crônica, que não adianta me mandarem mensagens solicitando que eu clique em determinado link, nem adianta dizer que me marcou junto com mais 44 pessoas; olha, eu vou ser honesto, não é que sou esperto e por isso eu não clico; o que eu tenho é preguiça mesmo.  Aliás, sou do tempo em que cutucar alguém era ofensa. Lembro de quantas vezes já briguei na escola por brincadeiras de cutucar, beliscar, morder. Não sou igualmente de ficar curtindo, uma vez que é meio estranho, por exemplo, alguém dizer que está triste por que acabou de perder um ente querido e logo abaixo da postagem eu e mais 44 pessoas optamos por curtir essa situação; aliás, por que sempre 44 pessoas?

Sem falar que existe o fato de que toda vez que curtimos alguma coisa ou comentamos, vêm notificações de todos os comentários e curtidas futuras que as postagens receberem. Por isso que desativei todos os sons possíveis de meu computador e de meu celular, para que eu não seja importunado por um pio, um assobio, um barulhinho, um grunhido qualquer que chame minha atenção para voltar a fixar meus olhos na telinha luminosa para ler que alguém curtiu uma postagem que eu tenha comentado.

Para finalizar não me chamem para jogar joguinhos como CityVille, o tal do The Sims Social; nada de Adventure World – Indiana Jones, Mafia Wars 2, Bingo Blitz, Words with Friends, Tetris Battle, PixelJunk Monsters, Gardens of Time, Empires & Allies, Dragon Age Legends, Double Down Casino, Diamond Dash, Slotomania e claro que não vou jogar como você FarmVille, nem Farm Ville 2; ah, nem me chama para jogar Panda Jam e muito menos ainda Candy Crush Saga. Eu não jogo mesmo; acredite, está bem?

Alguém até poderá me diagnosticar como antissocial na web sociedade... ou afirmar que sou um cidadão que possui um eu virtual em crise, uma vez que não socializo bem nesse universo digital. Pode ser que tenham razão e me alcunhem como o chato das mídias sociais. Fazer o quê? Ao menos eu ainda me dedico à difícil tarefa de existir off line.

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